quarta-feira, 10 de novembro de 2010

sobre a Noite

Não é acaso que à noite tudo sai do padrão.
O submundo psíquico sintoniza instintivamente com a ruína da ordem civilizacional. A noite dos néones distorcidos e do fumo, das clareiras negras e as fogueiras claudicantes, o refúgio primordial da criação, a placidez ilusória do caos nocturno. Nada é directo, tudo reflecte como a luz solar na lua e emerge o oculto que exercita os seus transes nos bosques distantes, o simbólico personificado nos ritos. O céu pouco distingue do mar, para a linha do horizonte se perder na matéria negra.
Eu habito a noite cada vez com mais reverência, algo de paixão artística se conforta na subtileza das horas longas. Silvos esporádicos segredam o mistério do que existe além do visível. Todo o vácuo para explorar, alheio às coordenadas. Morte e impulsos inconscientes, sonhos e estados alterados de consciência.
Acendo uma vela e pego em páginas muito antigas. Uma iluminação precária com aquelas palavras exaltam um ambiente quase sagrado no meu psiquismo. Percebo os olhos do lobo cintilando muito quietos na escuridão, percebo o que faz o homem de gabardina sob o candeeiro com o seu cigarro noctívago. Largo uma ultima página no raiar de um novo dia.

Sem comentários:

Enviar um comentário