domingo, 18 de março de 2012

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Cicatriz

Quem é a "autoridade" da tua vida?
Eras pequeno quando todos te diziam o que fazer, o que pensar, o que sentir, como cagar. Agora és o chamado adulto, com a sagrada aprovação do teu livre arbítrio.
Quem vai sofrer? Quem deve decidir?
Se percebeste o peso que te estou a passar...o que te prende?
Repara em todos os dedos apontados quando ficas nu. Estou aqui a cortar dedos apontados e a ficar nu contigo.
Perceber a natureza humana não é uma sofisticação intelectual, um entretem de uma mente excitada... é algo relacionado com a nossa felicidade! Tudo o que bloqueia a tua natureza, contraria-a ; entra em conflito. No caminho da sua compreenção, percebendo as matrizes do jogo, estas mais capaz de entrar em harmonia.
Ter valores só é benéfico quando sabemos lá chegar. Quando não sabemos, auto-flagelamos, porque está um ideal a ser e "eu não sou assim", nem o alivio de saber alcança-lo.
Eu já me vomitei ao espelho, sei o que é essa merda...essa merda de punir as minhas falhas completamente cego para ver possibilidades de fuga, cortar pulsos e cheirar a merda... ainda choro com essa merda...

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Cegueiras

Bsta olhar para o nosso corpo subjectivo, para dentro de nós, e ter uma certa noção de tudo o que evitamos. Há coisas que não encaramos, que simplesmente não queremos ver e dissimulamos, deturpamos, sabotamos a realidade com visões mais cómodas. Podemos não aceitar, podemos não compreender. O início é em reconhecer que lá está, o que já é uma predisposição subtil para aceitar.
Se não aceitamos o que somos, geramos tensão e conflito, atitudes destrutivas e insegurança. Todo o receio perante a vida, reside no drama que há dentro de nós. Se temos medo de alguma coisa deveria de ser de nós, pois é de nós que parte tudo o que nos pode magoar. O essencial está dentro de nós e não nos brinquedos exteriores. Se estamos devastados por uma depressão profunda, não há brinquedo, nem mesmo um filho que façam diferença. O essencial está destruído.
Alguns reconheceram o essencial e desenvolveram-no, sentindo em constância estados diametralmente opostos à depressão, que os torna invulneráveis ao chinfrim mesquinho do exterior. A jornada para essa intrepidez perante a vida, inicia com a auto-aceitação, o que exige uma tremenda abertura mental.
Mentalidade aberta é uma capacidade de recepção de estímulos novos, é uma exploração indiscriminada de perspectivas.
Temos de abalar o dado adquirido e toda uma estrutura de conceitos da nossa sociedade actual. De facto é um desafio severo, que requer coragem e lucidez, à pressão social que formatam a nossa mentalidade. A recompensa, é uma satisfação pulsante, um carinho pelo que somos, que favorece uma vontade de absorver a vida, um paladar novo e sensível para degustar as paixões da vida.
A fonte emanante de ideias é extremamente relevante, porque regula a nossa disposição emocional. Alguns ouviram o discurso carismático de Hitler e assimilaram as suas ideias como verdadeiras. Como pôde ele criar tantos seguidores devotos e tantos opositores fervorosos se estamos a falar de ideias supostamente objectivas?
As ideias de Hitler são para a maioria das pessoas predominantemente asquerosas (emocional) e secundariamente erradas (racional). É esse senso de asco que nos faz nem querer ver ou explorar. A sensibilidade contrai-se com certas ideias e visões que nem entraram na introdução do que sustentam. Mesmo a nível consciente e declarado muitas pessoas dizem: “Não quero acreditar nisso independentemente de estar certo ou errado”.
Sou levado a afirmar que a primeira barreira para a compreensão é a emoção. As relações interpessoais chegam a ser muito emotivas, porque activam mais o ego. A nossa lógica e raciocínio permite-nos construir arranha-céus e computadores, mas com uma pessoa à frente esse mesmo raciocínio, na sua coerência, é dúbio. Quanto mais perto do ego é o assunto, mais elevada é a carga emotiva e a distorção dos argumentos, moldando-nos à nossa vontade. A calma é equivalente perante ideias, de distanciamento. É em estados insolitamente calmos que a lucidez e a predisposição para compreender estão à mais elevada qualidade. Vemos em que consiste a ideia, os seus pormenores, a sua objectividade possível, reconhecemos e com a mesma calma tiramos conclusões.
Todo o ser humano está susceptível às distorções geradas, pelo oscilatório neurótico malabarista de opostos na nossa mente. Como um lago, quanto mais calmo e estável está, mais fiel à verdade é o que reflecte.

A assimilação de ideias opera-se por proximidade e afinidade à trama ideológica já existente. São aquelas ideias que já suspeitávamos em tom intuitivo serem verídicas que mais facilmente atravessam o filtro crítico. Generalizando, temos muita dificuldade com a diferença alienígena. Tendemos a criar reflexos de nós, mesmo no âmbito de ideias, se estas são extravagantemente opostas às quais nos identificamos, lugar-comum, são repelidas. Mas se a ideia insiste em aparecer-nos à frente, cria-se uma familiaridade e assim talvez seja assimilada.
Normalmente no argumento e partilha social, chegamos a conclusões por palavras de certa conotação em determinada cultura. “É anti-natura” por exemplo, pode encerrar uma argumentação. Ou “isso é para fracos”. Há milhares de palavras-chave que cessam a reflexão devido à sua conotação de finalidade. Uma espécie de valores sociais. “Estás a ser egoísta”. Chamo-lhes fantasmas argumentativos. Porque não têm fundação argumentativa estruturada. Até pode ter mas não estamos cientes dela quando as aplicamos. Sempre as ouvimos e aplicamos como argumentos sólidos. É inusitado mas fácil quebrar o padrão:
-És egoísta
- Porque não posso ser egoísta?
-Porque magoas os outros com a tua atitude.
-Mas o que me interessam os outros se sou egoísta?
Há como que uma mentalidade colectiva, não em termos de ideologia, essas são muito especializadas e individuais, mas nos processos de argumentação. As convicções e crenças do indivíduo são díspares e peculiares, mas as palavras que usamos para a sua descrição e mesmo a sustentação de tais são quase previsíveis. E mesmo assim, ideias originais de completa surpresa tão fora da mentalidade de enfiar em gavetas, são raras. Mas já com as mais abrangentes há tanta disfunção…
A empatia é das capacidades mais valiosas a nível social, porque mesmo não tendo uma mentalidade igual em determinado aspecto podemos criar identificação com tal pessoa. O suporte inicial da empatia é a humildade. Não a humildade derivada do sentimento de inferioridade como é comum apresentar-se, é uma pena existir mais nessa condição, mas uma humildade gerada por ausência de atitude defensiva, de alguém que não teme uma alteração repentina no seu dado adquirido confortável, de elementos que o fortalecem enquanto ego.
A empatia é uma projecção emocional e mental do outro, na nossa visão. Requer entrega, abertura mental e uma intuição muito apurada dos processos argumentativos. Ouvir palavras de uma pessoa é fácil, ouvirmos as suas sensações é o que nos permite compreender. A barreira da emoção é quebrada e a união é possível.

É altura de aproximar da origem da cegueira:

A sociedade no seu decorrer de épocas suportou muitas mentalidades diferentes. Como “gostamos” de fazer pomos rótulos na testa das pessoas. Uma criança apenas é, natural e sem senso de culpa, não a podemos delimitar na sua loquaz maneira de ser. Mesmo assim tentamos, porque tudo o que representa caos assusta-nos. Temos de pôr as coisas em gavetas e a criatividade primordial do ser nada tem a ver com rótulos gavetas e cercos.
A criança, a ser, nasce livre. A certo ponto quando a comunicação é mais possível dizem às flores que não deviam ter espinhos, começa a repressão de determinados comportamentos, mais comum através de manipulações baseadas no que pode suscitar medo. Coisas primárias são reprimidas e passam para um plano mais inconsciente, comprimidas para recantos da mente, querendo expressar-se e “inchando” atrás do pano do grande teatro. Primárias porque brotam da fonte e não podem ser substituídas, bloqueiam a fonte e cria-se caminhos estranhos de expressão. Os factores secundários começam a estruturar-se, o que seria para Freud, o super ego. Uma multidão simbólica ajudando a repressão dos factores primários, uma trama de certos e errados deambulando em fricção pela mente e indo fundo na nossa constituição elaborando no plano emocional uma coerência entre o que achamos certo e o que se sente ser certo, as mentalidades formam-se na pluralidade de educações possíveis. As ramificações são intermináveis: Canibais, samurais, cristãos, democratas, espiritualistas, nacionalistas e por esse mundo fora.
Ora os factores secundários são descartáveis, daqui a um século tudo será uma outra moda de mentalidades, a essência da natureza humana lá estará, primária, talvez não tão soterrada com máscaras, maquilhagens exuberantes e coisas anormais a que tão bem nos adaptamos, sacrificando o apenas ser. O homem, à sua natureza, rodeou-a de julgamentos e censuras. Em tudo o que constitui o universo apenas o animal humano concebe estar errado ou certo, e sentir culpa, não estar em harmonia e fluir. Pensamos que a natureza humana é perigosa e tem males que ameaçam o conceito de civilização. Pois esses males resultam da falta de aceitação, do julgamento imposto desde cedo. Há maneiras de atenuar os impulsos violentos das crianças, sem necessariamente as reprimirmos. Ao valorizar aspectos sociais e individuais positivos estes crescem e ao não dar atenção aos negativos estes enfraquecem, podendo até ser desviados para elementos inofensivos. E isto da atenção é quase uma lei da natureza possibilitada pelo ser humano. Prestar atenção faz crescer. Se prestarmos atenção com alguma mais intenção a um pensamento ele torna-se mais substancial pois deslocamos através da atenção energia para ele. Uma planta pode desenvolver-se mais rapidamente também por esse processo. Ao focar atenção damos-lhe vitalidade. Ao dar atenção e valorizar uma atitude da criança estamos a reforça-la. Devíamos mesmo festejar desalmadamente o que queremos reforçar na criança. Se fizermos isto por exemplo num desenho que ela tenha feito, ela de certeza desenhará mais, como também o fará melhor porque começa a acreditar na sua capacidade de desenhar. Em vez disso damos mais atenção à criança quando ela está doente. Reforço: Para os canibais, comer um amigo é uma formalidade e sentido como correcto. Somos moldáveis ao inimaginável quando novos. O chamado adulto responsável comum, da nossa sociedade actual não tem competência emocional para educar crianças. Até o riso em excesso é reprimido com severas ameaças de que ninguém vai gostar dela se fizer isto, que a prendem num quarto se faz aquilo. Que se não se cala leva uma bofetada. Depois às vezes é sim outras é não e a criança fica confusa e neurótica. Poucas crianças tiveram a hipótese de o ser. A criança aprendeu a ter medo de agir. Mesmo em adultos continuamos a pedir atenção e aprovação. A mais breve rejeição ocupa-nos a cabeça durante o dia inteiro. Com tanta insegurança como podemos não estar contraídos a estímulos novos?
O medo é globalizado e é tão raro encontrar alguém tão abundantemente satisfeito com o que é. Uma pessoa espontânea reflecte uma grande consideração e aceitação de si. Hesitação e excessiva actividade cerebral não intencionada, acontece na tentativa de resolver conflitos, em principal destaque para o que a pessoa é e deseja mudar. Há sempre algo a mudar, uma insatisfação existencial que não é mais que os errados, a negação e mesmo a fealdade da sua auto-imagem. A pessoa que “é”, que está confortavelmente integrada no presente e espontânea, tem impulsos violentos breves e efémeros causando danos superficiais, à medida da situação. Se mesmo nenhuma raiva tem contra si, pouco terá para os outros.
Já crescidos não são precisos pais ou educadores de alguma espécie, aprendemos a nos reprimir por nós. A repressão mais delicada e perigosa é a sexual. O sexo é um aspecto primário que mesmo reprimido com todas as chantagens não pode deixar de se exprimir. De forma tacanha lá vem das profundezas e exprime-se debilmente e tímido, longe de completo. Tudo o que não é exprimido totalmente incha dentro de nós, acumula em intensidade e este é um dado já constatável de veracidade nas provas objectivas da psicologia convencional.
Os esquimós que existiam há décadas atrás (principalmente esses) mal referiam assuntos relacionados com sexo, porque era tão natural e aceite que não “inchava” por expressão, nem representava alguma espécie de conflito nas suas mentes. Tentar bloquear uma energia tão primária como a sexual germina uma tensão por todo o sistema biológico. Aumenta o nosso potencial neurótico. Disse no início do trabalho o papel da coragem para nos aceitarmos. A nível pessoal todos gostamos de pensar que temos uma mentalidade aberta. Se perguntarmos directamente dá a sensação de haver um feitiço contagiante misterioso pelo mundo fora que inibe alguém dizer:
-Sou uma pessoa muito estreita de perspectivas
É que não me parece (e aqui há de certeza sintonia) viver numa comunidade aberta. Onde estão essas ditas pessoas de mentalidade fechada?
Basta olhar para nós, podemos não aceitar, podemos não compreender. O inicio é em reconhecer que lá está…

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O pedestal está vazio

Ao tentar perceber a estética dos órgãos internos, dei por mim a pairar num vácuo, como uma tela que ficou em branco.
Há uma beleza que quase se esconde, mas foi com arquétipos dessa beleza que comecei a saber o que pintar.
A televisão está a conseguir criar mais valores universais do que os argumentos da ética e as leis divinas da moral, e quando preciso, defende-se pelos mesmos meios dizendo que “é só televisão”. Pois a televisão é o grande artista pintando telas de muita gente, esculpindo a estética dos órgãos internos quando só parece dar dicas de maquilhagem. A televisão é um bom brinquedo para quem controla os filtros críticos, para os outros é influência directa no subconsciente, seja de que cor for…

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Liberdade forçada

Há cargas emocionais, quando habituais, fazem um cerco à liberdade comportamental. Para agirmos, temos de usar a vontade. O medo paralisante com toda a sua carga fisiológica, empurra o ser para o resguardo. Comum observar o fenómeno que apelido de "liberdade forçada" em que agimos na direcção contraditória da carga emocional. Em medo extremo os guerreiros investem contra o seu elemento temido, o batalhão de soldados da oposição, fiel aos valores que justificam o seu comportamento, que exercem a "liberdade forçada". Foco o fenómeno na carga emocional: medo. Por ser a mais relevante no dia-a-dia, a mais dominante e escravizante. Quando novos reagimos ao medo sem qualquer "liberdade forçada". O medo surge e adoptamos o comportamento associado, sem qualquer desvio ao que sentimos. Quando o conflito entre o que acontece e o que deve ser se instala, começamos a exercitar o poder da nossa vontade psicológica para fazer o que queremos aparte do sentimento de medo. Em estados de medo extremo, algo tem de balancear no outro lado para forçarmos o comportamento contraditório. Considero de grande força psicológica, as pessoas que exercem a "liberdade forçada" com poucos valores balanceando no lado oposto do medo, aqueles despoletam uma vontade avassaladora por mera decisão. É esta força que nos faz confrontar as nossas inseguranças, e conhecido pela comunidade científica, para acabar com uma fobia, é suficiente enfrentar o elemento aterrorizador para a "liberdade forçada" se tornar numa liberdade espontânea, aproximando-nos sereno do que antes nos atormentava. A vida vai tendencialmente colocar obstáculos que se superam com a "liberdade forçada". É habitual quem tem esta força ser bastante confiante, quem a usou em variadas provações, porque além de superarem as suas inseguranças, sentem-se capazes como pessoas.
Puxar pela resistência física, é um treino moderado de força de vontade se não tiver envolvido valores maiores que apenas fortalecer esta. Deixar de fumar está uns graus acima, pela proximidade dos sintomas a combater estarem próximos à ferramenta da vontade, o pensamento. O mais complicado em relação a dependências é a batalha psicológica, e os sintomas físicos são relevantes apenas no sentido em que vacilam a veemência do pensamento. O aspecto crucial de todos os processos de fortalecimento mental é o tempo, que a cada cadência enfraquece a vontade. O ideal é viver em fluidez com a corrente da vida, mas ter uma vontade robusta quando somos destacados para superar obstáculos. O que está a ser cada vez mais comum é encalhar em aflição perante um obstáculo mais austero, que nem é uma condição física. Quanto ao saber fluir com as melodias inusitadas da existência, aquela ausência de conflito que revela os melhores cumes de harmonia soante, já esse amadurecimento como ser, é raro. Porque não é isso que querem de nós. Há sempre alguém a querer subir na hierarquia de poder, a querer deter controlo sobre o outro, a apoderar-se de território à custa do território do outro. A querer delimitar a sua perspectiva confortável de vida, pois se conseguimos cercar algo, podemos agarra-lo com a mão. O homem livre é temido, porque nada tem mão nele.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Poças de merda

Privacidade?
Aquilo era um mundo estranho.
Para sobreviver tive de largar alguns conceitos
Aqui gera-se um padrão, para evitarmos o desconhecido
Se tudo for previsível, não temos de lidar com o Caos.
Tenho um certo orgulho, por ter estado lá, no Orco, para além do impossível, onde os corações desfalecem em cinza. Agora percebo quem eram os meus educadores, embora na altura, havia uma sensação de desolação árida, não era solidão, era saber que estava por mim. Pois a mão insidiosa largou-me na mais caótica carnificina. Enfrentar o desconhecido era inevitável… Longos desertos de agonia, apunhalado por corvos fumegantes, zunires de demência. O maior aprendizado de certos sofrimentos, consiste em conseguir levantar sozinho. Bem no meio da desordem psicótica, olhos e vozes por todo o lado. Bem no meio da poça de merda, erguer o peito e caminhar como um danado.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Lei Divina

As pessoas estão a ficar iguais… as linhas que dividem estão onde?
Eu comecei a faze-lo por mim, laboriosamente tecendo uma auto-imagem rica e mais aprazível. Desde cedo percebi quão fulcral é a auto-estima no todo que é a nossa vida, mas era um entendimento teórico, menos substancial no mundo a que chamamos “ter uma experiencia”.
Foi preciso desmoronar, como um escravo escavar o buraco existencial, e de lá não saber sair. Lá em baixo, numa espécie de submundo, deparei-me com uma realidade desfigurada, delírios febris, uma pestilência macabra cerrava a atmosfera, constantemente espancado com o peso de multidões em urros de carnificina. Os que me podiam ajudar lá na superfície, lançaram gasolina em cima de mim e fizeram-me arder. Uma outra noção de calor humano. Mas alguém ajudou-me a sair da cova, poço, abismo, essa abstracção literária bem presente em muitos. Com um sorriso já quase esquecido caminhei pela cidade sem medo de ser apunhalado. Ganhei o meu espaço e agora era possível ser construtivo com algumas probabilidades mais a favor. Percebi o que tinha de essencial a experiência: Um ódio lancinante a tudo o que eu era, tão forte que inconscientemente o temia, ao ponto de não se manifestar o aviso…com tanta pressão dentro de mim implodi. Comecei a levar a sério o termo usado em psicologia ocidental: Auto-estima. Discordo que ela se fundamenta exclusivamente na bem-sucedida vida social. Esta estima alimentada de “sucessos sociais”, por si só, gera os chamados, e tão odiados, “convencidos”, eles lá tem a sua liberdade, mas os que estão sob a alçada da voz de um “convencido” sentem-se limitados no seu ego e então a reacção mais natural é odiá-lo. Há “convencidos” que cristalizam o seu status de superior e já ninguém os tira de lá, esses além da ameaça ao sentimento de inferioridade, provoca a sensação de haver uma só voz na conversa e isso às vezes é o ponto final na relação que afinal de contas já não existia. Os “convencidos” cristalizados que são autênticos não se dão com muitas pessoas. Os “convencidos” ampliam as suas virtudes e estas ofuscam o “erro”. O “erro” é desvalorizado perante a exuberância das suas virtudes. Isto é um processo muito incompleto de auto-estima, porque o “erro” que eles detestam está lá, apenas fica colocado num local pouco iluminado do seu espelho. Que eles o detestam, é verificado na sua intolerância a pontuais características dos outros. Eles não aceitam (e agora a palavra aqui é bem colocada) o “erro”. A auto-estima de que falo, é fundamentada na aceitação global de tudo o que somos. “Erro” e virtude, beleza e fealdade, a harmonia entre o masculino e o feminino, hemisfério cerebral esquerdo e direito.
Comecei a faze-lo por mim, longa estrada por percorrer.
A criança não tem defesa aos insultos dos outros, trespassam a carne até ao ego e nesta fase o sucesso social é importante, mais tarde o nosso ego reveste-se de robustez suficiente para alterar de perspectiva pelo raciocínio desenraizado da mentalidade colectiva. Foi a mentalidade colectiva que feriu a criança, bem cedo. O julgamento no intuito da ordem harmoniosa, está a gerar ódio. O processo de aceitação, não enfraquece o discernimento, nem o sentido crítico factual. Sabemos exactamente com quem estamos a lidar, só não há censura.
Comecei a faze-lo pelo meu gáudio imperial… aceitar-me. Mesmo o aspecto mais repugnante, dei-lhe hipótese de respirar, convivi com ele sem lhe impor uma pena. Pelo percurso sinuoso, quanto mais libertava á naturalidade, mais “podres” emergiam, que disparavam inevitavelmente uma carga emocional punitiva. Aqui estava o cerne, o núcleo duro desta lenta metamorfose. Lenta porque envolve emoções enraizadas associadas a perspectivas. Quando estamos mais calmos as perspectivas são mais voláteis. Então inicialmente a aceitação fortalecia através de relaxamento, com este relaxamento cada vez mais profundo é fácil decidir, é fácil ser tolerante a pensamentos que anteriormente doía de enfrenta-los. Desbravei muito egoísmo reprimido em mim e esses chamados “erros”, o certo é que a minha insatisfação dissipava. Ao longo do tempo fiz muitas caretas de surpresa ao espelho interior, coisas que pensava não existir em mim. Ao longo deste tempo, o medo e todos os derivados nocivos apaziguaram a sua revolta neurótica e voltava à premissa da mentalidade colectiva: Ordem harmoniosa.
O que começou como uma volúpia egocêntrica evoluiu para uma postura social aberta, “até onde tu fores, eu vou ao teu lado”.
Não há julgamento relevante ao que “és enquanto pessoa”, lá no olimpo psicadélico estão os extraterrestres coloridos a consumirem-se em culpa e a ir a confessionários com chicotes pelas costas abaixo para lavar a falta de respeito. Eles são de outro mundo, inventaram uma maneira de não ser humano, negando-se. Eu deduzia em teoria toda esta coisa da auto aceitação a longo prazo abranger também a harmonia social, mas agora estou a vive-la. Dou por mim entusiástico para a solidão e a comunhão. Acho que quando nos sentimos mal sozinhos é quando a constante companhia, nós mesmos, não é agradável. O suposto criador do conceito “lei divina” não tencionava punir ninguém, apenas orientar as pessoas para o templo de Deus. O que ainda não acontece porque também não é desejável no jogo do poder humano, é orientar…castiga-se, e lá bem no fundo não é um castigo, é uma vingança…

quinta-feira, 10 de março de 2011

A mecânica da Arte

Nos confins da natureza submersa, uma maça onírica, caí na cabeça do escritor. Um clarão esparso arrepia-lhe as ligações sinápticas e um impulso visceral, rebenta os limites corporais. Pela imaginação cria um outro tipo de vida. Existe pela capacidade de abstracção da realidade corrente no padrão mnemónico.
A arte não é uma tarefa, é uma experiência anacrónica, feita do mesmo tecido da criação primordial. Queremos algo pulsando de vida, mas a obra literária é amorfa, não tem consciência, ela vive na consciência das pessoas. Quanto mais pessoas a lêem, maior se torna. Quanto mais finca as presas na sensibilidade da pessoa, maior o seu carácter.
Depois de ler a ultima página e o que a pessoa vai fazer ao mundo com o que acabou de ler… e o processo de criação pode apenas estar a começar.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Homem confiante no sinistro fim do mundo

É até onde me lembro.
Estava um cão de rua esventrado no meio da estrada de alcatrão, a sangrar interminavelmente. Daquele corpo não podia verter tanto sangue, mas assim acontecia. Uma poça enorme alastrando cada vez mais. O cão tinha um corte na zona abdominal, era um rafeiro já muito velho; surrealista que estava ainda vivo. Quando revirou os olhos, o momento da sua morte, o sangue deixou de expandir em diâmetro e formou um fio corrente pelas ruas. Enquanto caminhava seguindo o sangue, notei que mantinha-se quente, com o vapor do calor serpenteando no ar pelas ruas correndo. Sugiro que algo estava ali vivo muito próximo do que é animal.

Qualquer coisa mantinha-me acordado, com uma concentração fulminante, como se captar o que existe dependesse da minha sobrevivência, embora não aflito, tinha as sensações aguçadas e não controlava algumas coisas que fazia. Tentei ir por outro caminho que não o do sangue mas um medo estarrecedor, visceral, aplacou-me e assim fui pelo caminho. A minha mente parecia estar a interferir nos locais onde passava. Algumas imagens mentais projectaram-se na realidade objectiva. Ah e a luz agora estava verde. Sim, estava um grupo de pessoas encapuçadas de cruz na mão e em coro diziam: “A luz das máquinas é verde”, só isso, entoando num ritmo lento e quase monocórdico, grave. Pois era noite há tempo demais e a luz dos candeeiros tornaram-se verde e embora a minha concentração vívida e os encapuçados de rosto oculto já longe estarem, revoltava na minha cabeça o seu canto solene. Estava a dar comigo em louco e as luzes cada vez mais verdes. Não estava em controlo da situação e agora que repenso nisto as cruzes estavam viradas ao contrário. Confuso tento fazer sentido: ”verdes são as notas”. Grande esforço de vontade para fazer sentido… uma lucidez plácida seguido de uma concentração ainda maior e a luz voltou ao amarelado normal. É uma luz mais “quente”. Quando pensei nisso senti calor nas pernas e julgava ser a mente a interferir na realidade que já não sabia ser objectiva. Era sangue. Mas não era meu, tinha uma faca de mato no cinto de cabedal e lembrei-me do cão esventrado. Espanto! – fui eu que comecei com este trilho de sangue- E nesse momento o sangue parou de escorrer pela rua. A medo afastei-me, mas nenhum sinal daquele terror bafiento. “Para onde vou?”
A concentração era agora sobrenatural e o ambiente condensava.
Percorri uma viela sem iluminação apenas uma aparição tosca da lua refulgindo nos objectos. Há tempo demais que não via ninguém, os prédios não tinham janelas, eram paredes rugosas enegrecidas. Lixo e cheiro a gordura. Concentrado. Mal havia céu. Os prédios eram torres robustas altas como arranha-céus. Vi um candeeiro acesso, mais próximo um vulto sossegado de cigarro na mão, em gestos lentos leva o cigarro à boca e expele o fumo para cima com convicção, vadeando pelo ar. Aproximo-me medindo os passos, a certa distância dele cumprimento-o.
Tinha um chapéu que fazia sombra na sua face.
Homem confiante no sinistro fim do mundo – Ainda bem que conseguiste afastar do sangue, não era suposto ele te levar a mim. Nesta vida…
Eu – Quem és tu?
Homem confiante no sinistro fim do mundo – Uma imagem na tua cabeça; sou apenas uma ideia
Eu – Estou a imaginar-te?
Homem confiante no sinistro fim do mundo – O mundo está a acabar, isso não é importante, tens de apreciar o fim do mundo; queres um cigarro?

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

sobre a Noite

Não é acaso que à noite tudo sai do padrão.
O submundo psíquico sintoniza instintivamente com a ruína da ordem civilizacional. A noite dos néones distorcidos e do fumo, das clareiras negras e as fogueiras claudicantes, o refúgio primordial da criação, a placidez ilusória do caos nocturno. Nada é directo, tudo reflecte como a luz solar na lua e emerge o oculto que exercita os seus transes nos bosques distantes, o simbólico personificado nos ritos. O céu pouco distingue do mar, para a linha do horizonte se perder na matéria negra.
Eu habito a noite cada vez com mais reverência, algo de paixão artística se conforta na subtileza das horas longas. Silvos esporádicos segredam o mistério do que existe além do visível. Todo o vácuo para explorar, alheio às coordenadas. Morte e impulsos inconscientes, sonhos e estados alterados de consciência.
Acendo uma vela e pego em páginas muito antigas. Uma iluminação precária com aquelas palavras exaltam um ambiente quase sagrado no meu psiquismo. Percebo os olhos do lobo cintilando muito quietos na escuridão, percebo o que faz o homem de gabardina sob o candeeiro com o seu cigarro noctívago. Largo uma ultima página no raiar de um novo dia.

sábado, 23 de outubro de 2010

Orgia agendada para dia 13 na Igreja da Graça

Há demasiada gente arruinada no seu inferno pessoal, devido a uma “traição amorosa”. Se é o teu caso peço que não leias esta texto, não te vai acrescentar nada e poderá ainda contribuir para mais revolta.

O sexo é um mistério revelado na filosofia do tantra. É criação dinamizada, ostensiva e fulcral no crescimento de qualquer pessoa. O que acontece normalmente nesta sociedade de bebedores de bicas é o domesticar, de tal forma absurda, que se pode tornar tedioso, e então os casais vão ao baú de experiências e imagens de outras mulheres e homens, para sentir tesão. Exactamente, a força criadora tornou-se lugar-comum, e quando não resgatam a novidade mentalmente, dado adquirido lá se ganha coragem para uma aventura com o/a amante. Normalmente tal façanha é moralmente desconfortável a primeira vez.
Estamos a iludir quem? a natureza? Não podemos desenraizar a natureza, mas acima do solo fazemos tudo dela, pintamos cores diferentes, cortamos rente, tapamos com um monte de merda (caso dos padres).
Enquanto a paixão tende a ser mais selectiva unindo esforços num único individuo, o sexo tende a constantemente diversificar o seu objecto de desejo. Nem a paixão ou o sexo são acontecimentos previsíveis como os ponho. há quem se apaixone por varias pessoas ao mesmo tempo e há quem só tenha desejo sexual por uma pessoa. Amor é algo que falo com reserva porque não completei o meu curso de vida no Tantra.
O que está aqui a sabotar a harmonia é o ciúme, o sentimento de posse. O ciúme não é inevitável em relações intensas, sobrevive de inseguranças profundas, de lacunas que querem possuir algo, de uma intimidade mal resolvida. É raro a ausência de ciúme, mesmo nas pessoas mais confiantes e completas de estima, há uma pontada teimosa remoendo com a possibilidade da perda. Infelizmente temos poucos exemplos na nossa civilização de tais pessoas, ao ponto que tornamos a ideia de ciúme inerente a todo o ser humano. Estou agora mesmo a observar a meninice das pessoas: Um canário amarelo lindo, que o dono gostou tanto dele que o pôs numa gaiola, não vá ele usar as asas que estão lá como ornamento.
É de liberdade e aceitação e amor, de explosões e implosões de dar desmesuradamente porque amamos. O amor mais sublime não tem território, o mundo está lá para lhe ofertar ouro, incenso e mirra. Tenho sempre que recorrer a exemplos porque somos ser condicionados de uma sociedade de perspectiva estreita: Os casais que fazem swing, é um exemplo de pessoas que souberam não cair na monotonia, ao invés enriqueceram a sua união de uma nova vivacidade. Já para não mencionar algumas tribos em que o conceito de intimidade nem existe, pois não há pudor, que é um derivado do medo, filho da repressão. O mundo do sexo é vasto, não por acaso que me expressei como sendo uma força criadora.

Coloco-me numa escadaria larga que conflui para uma avenida abastada de carne humana, e vou espreitando a mente dos transeuntes:
*um homem não enfia o dedo no cu! *e não é que a puta me meteu os cornos*aquele gajo é um chonas*aquela gaja é uma vaca*no primeiro encontro nunca!*Quero tanto ter um orgasmo, só um…*Foda-se trocou-me por um monhé*não confio em ninguém*

Facada, traição, cornos… criaste o teu próprio mundo bélico contra o que se tornou o teu inimigo, o que dizias amar; tens-lhe amor, não O tens, nem a sua liberdade.

Não há absolutamente nada de errado com o sexo. De prazer ao amor, nada nele há de “impuro”. É uma energia base do ser humano. Um corpo tornado sensual. O corpo é um templo de prazer com o seu misticismo peculiar. Se concordas que o sexo é natural como uma planta, porquê tornar a planta num segredo, ou tabu, ou conversar baixinho para Deus não ouvir?

A ORGIA está agendada para dia 13
O padre vai atribuir um prémio ao preservativo mais original que é enfiá-lo no seu cu.

sábado, 9 de outubro de 2010

brinquedos

O desejo aliado à vontade,
e éramos crianças

Ora o artificial é usar a vontade para desfigurar o que brota imaculado da fonte, o desejo.

Nem por certo o artificial acelerou a evolução

Drogas para sentir algo do que é a evolução
Drogas para reparar algo do que a vontade arruinou
A nossa grande liberdade de conceber o inferno
A nossa grande possibilidade de não saber como

A minha delícia de ver possibilidades…

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

esfera

Uma esfera densa de tensão, todo o meu foco alarmado e com a intensidade progressiva de atenção, acontece o pavor. Qualquer movimento da vontade é inútil, à flama destemperada desarvorando contendo… um conflito brusco. A batida do coração assusta. Desta vez fico por aqui. Inspiro; os músculos flagelados de nervo bioquímico, distendem. Uma poalha periférica persiste, à tona da pele, como uma aura, e esta também dissipa; conforto


Uma barragem racha, sempre que imponho ao tento, a loucura. E a loucura acontece, palmando terreno para se alastrar, para formar uma enorme corrente marítima. Apenas fico louco mais vezes, em segredo.


A esfera está agora aberta, com uma fenda ampla, e vejo o núcleo duro, mas não consiste em medo. É uma energia indecifrável à minha compreensão imediata. De curiosidade aguda, observo, sem no entanto poder assegurar o que lhe seja. Determinei, pelo tempo que lhe dediquei, ser benigno, mas nada posso assegurar…